Na antologia dos desafios
entre o Brasil e a Argentina, as duas seleçőes mais rivalérrimas do
futebol do Novo Continente, até esta quarta-feira, 2 de Junho de 2004,
prevalecia um impasse: em 89 partidas, 25 empates, 32 sucessos cada qual.
A Argentina levava a vantagem numérica, no
saldo de tentos, 142 x 132. Mas, repleto, 40.000 espectadores, o
Mineirăo de Belo Horizonte empurrou o Brasil a um triunfo básico,
fundamental, nas eliminatórias da Copa da Alemanha, 2006.
Brasil 3 x 1, um marcador insofismável.
O Brasil assumiu o topo solitário da tabela de qualificaçăo, com doze
pontos em seis rodadas, global de dezoito possíveis. E limitou a
Argentina aos onze pontos, a segunda posiçăo.
O evento, quase uma celebraçăo, mais do
que uma simples partida de futebol, principiou com uma exposiçăo de
artistas consagrados -- Mílton Nascimento e Gilberto Gil, o Ministro da
Cultura do Governo Lula. Ambos entoaram o Hino Nacional, sob a belíssima
escolta da percussăo do rapper Mano Brown.
Mesmo sem Ronaldinho Gaúcho, o lídimo
super-astro do futebol do universo, no momento, lesionado numa coxa e
fora do jogo, também, contra o Chile, em viagem, no próximo domingo, o
Brasil se locupletou do fervor, feroz, da sua torcida. Sob a mediaçăo do
excelente Oscar Ruíz, da Colômbia, o elenco de Carlos Alberto Parreira e
de Mário Zagallo, soube como bater o time retrancado de Marcelo Bielsa,
apesar das falhas crônicas, e assustadoras, da sua rude retaguarda.
Ou, das suas deficięncias de estratégia
e de tática. Um time qualitativamente superior, pelos seus talentos
individuais, năo pode ceder nenhum espaço a um elenco muito inferior --
mas, engenhosamente mais estruturado. Roque Júnior e Juan, convenhamos,
bem mais apavoram do que limpam e rebatem.
O Ronaldinho Fenômeno fez 1 x 0, num
pęnalti indubitável, aos 14 minutos. E fez 2 x 0 aos 78, em um outro
pęnalti indiscutível. O Brasil poderia esmerilhar a Argentina.
Faltou-lhe potęncia, mais do que a determinaçăo individual dos seus
astros inúmeros. Dispusesse de conjunto, ampliaria o placar.
Previsto e anunciado, entretanto, o gol
da Argentina surgiu aos 79, através de Sorín, ex-Cruzeiro de Belo
Horizonte, num equívoco radical do miolo de zaga do Brasil.
Afortunadamente, para o Brasil, os minutos regulares se esgotaram e o
placar ainda se ampliou. Sem nenhuma promessa de futuro, porém.
O colombiano Ruíz, implacável, registrou
mais um pęnalti no Fenômeno, nos acréscimos. Ronaldo converteu, plácido,
preciso. Os 3 x 1, no fim das contas, representaram o placar justo. Mas,
inconvincente. No próximo domingo, o Brasil pega o Chile em Santiago.
Rudeza. Ainda que o Chile talvez năo tenha, no seu ataque, o ousado
Marcelo Salas.
MUDANÇA NAS REGRAS
Antes das eliminatórias da Copa da Ásia,
em 2002, o Brasil e a Argentina năo haviam se enfrentado, jamais, em tal
fase da competiçăo. Eram eliminatórias diferentes da atual, os países do
continente divididos em grupos. Costumeiros cabeças-de-chave, pela sua
tradiçăo, o Brasil e a Argentina, invariavelmente, disputavam os seus
postos em segmentos diversos e inencontráveis.
Aconteceu, porém, uma mudança nas regras.
Para 2002, a Conmebol, entidade que organiza o futebol na América do Sul,
decidiu promover um torneio de todos contra todos, em turno e returno.
No prélio de ida, no Morumbi, o Brasil sobrepujou a Argentina, com folga,
3 x 1. Daí, no cotejo de retorno, em Buenos Aires, desperdiçou uma
vantagem saborosa de 1 x 0, no finalzinho do combate, em duas falhas
terríveis da sua retaguarda, inclusive um gol contra, patético, do
zagueiro Cris, a Argentina eufórica com a virada, 2 x 1.
Foi grotesca, aliás, a participaçăo do
Brasil nas eliminatórias de 2002. Em seu percurso, dezoito pugnas, teve
quatro técnicos no seu banco: Vanderlei Luxemburgo, Candinho, Émerson
Leăo e Luiz Felipe Scolari. Apenas garantiu a sua vaga no último desafio,
um ralo placar de 3 x 0, na medíocre Venezuela, no Estádio Castelăo,
dentro de Săo Luís no Maranhăo.
Scolari levou o Brasil ao título da Copa
da Ásia. Mas, logo depois se demitiu. Optou por desfrutar um período de
férias, de viagens, e de análise de propostas internacionais. Assumiu a
equipe de Portugal, o anfitriăo da Eurocopa deste 2004. E a CBF resgatou,
no passado, Parreira & Zagallo, os dois ganhadores do título do Mundial
de 1994, nos Estados Unidos.
Ironicamente, permanecem os mesmos os
problemas que, hoje, em relaçăo aos seus antecessores imediatos,
apoquentam Parreira & Zagallo. Desde o excesso abusivo dos craques
expatriados até a dificuldade cruel de congregá-los, e de prepará-los,
com um mínimo de espaço de tempo e de dignidade.
De qualquer modo, com o resultado de
Belo Horizonte, o Brasil recupera o domínio das eliminatórias da América
do Sul. E relega a Argentina a um segundo lugar. O Chile, que bateu a
Venezuela, nove pontos, como visitante, 1 x 0, subiu ao degrau dos dez.
O Paraguai ficou nos dez, que já acumulava ao tropeçar na Bolívia, seis,
mandante, 2 x 1.
O Peru, agora oito, sob a batuta
periclitante do brasileiro Paulo Autuori, arrasou o Uruguai, sete pontos,
em Montevidéu, 3 x 1. O Equador, agora sete, relegou a decadente
Colômbia, quatro, ŕ rabeira da tabela, ao superá-la, em seu domínio, 2 x
1.